Motivado por um projeto educacional do distrito, Rotary Club de São Paulo-Sumaré adota afetivamente uma unidade de ensino fundamental integral na Zona Oeste paulistana
Uma lenda peruana conta a história de uma mãe que abandona seu bebê na floresta para salvá-lo da peste que dizimou todo o povo. O bebê então se transforma numa ave que, todas as noites, lamenta a ausência materna. A ave em questão é o urutau, e essa é apenas uma das narrativas que formam o folclore em torno dele.
O urutau é uma espécie comum em bordas de florestas, campos com árvores e cerrados. Aqui no país, cinco variedades podem ser encontradas pelo território nacional, inclusive em cidades, nas partes mais arborizadas.
Suas penas, marrons ou cinza, permitem a ele se camuflar entre galhos e troncos. Por causa disso, ficou conhecido como fantasma da Amazônia, onde é visto com frequência. O urutau mede em torno de 35 centímetros de comprimento e é uma ave noturna, de canto melancólico e fúnebre.
Apesar do imaginário que o cerca, é provável que na Escola Estadual Brigadeiro Faria Lima, uma unidade de ensino fundamental 1 em tempo integral localizada no bairro do Sumaré, na Zona Oeste da capital paulista, as crianças associem o urutau a lembranças nem um pouco sombrias. É que essa foi a instituição de ensino escolhida pelo Rotary Club de São Paulo-Sumaré como beneficiária do projeto educacional Leia o Seu Futuro, proposto em 2022-23 pelo então governador do distrito 4563, Joaquim Flávio de Moraes Filho. Há um ano, o clube a adotou afetivamente e vem desenvolvendo ali uma série de iniciativas entre elas uma sessão de autógrafos com a coautora de um livro de literatura infantil que fala do urutau.
“A escola foi escolhida entre várias de ensino fundamental que visitamos na região do Sumaré e Perdizes porque sentimos a disposição e a empolgação da diretora Eliete Martins Cardoso de Carvalho em adotar algum projeto diferenciado que beneficiasse os alunos”, conta Plinio Luiz Sottomaior Pereira, presidente do São Paulo-Sumaré.
Definida a escola, a primeira providência do clube foi procurar saber quais necessidades poderiam ser atendidas. “Soubemos que havia um desejo de promover ações na área ambiental para satisfazer diretrizes do programa educacional do governo do Estado de São Paulo”, Plinio diz. O clube então elaborou planos e orçamentos de modo a solicitar um Subsídio Distrital com o objetivo de instalar na escola um sistema de reúso de água da chuva. “Percebemos que era uma necessidade para economia de água para limpeza e rega da horta dos alunos, e que seria de fácil instalação, ao lado da quadra de recreação coberta, se desviássemos um dos coletores do telhado para uma cisterna”, detalha.
O São Paulo Sumaré se comprometeu a subsidiar parte do projeto, e em fevereiro a instalação do sistema foi concluída. No mês seguinte, o clube iniciou outra ação na escola. “Em visitas realizadas na hora do lanche das crianças, as professoras apontaram a necessidade de um reforço às sextas feiras, na saída dos alunos para suas casas”, relata Saulo Ortega Trevisan,
presidente do clube em 202223. O São Paulo Sumaré então fez chegar até a escola seu projeto Pãozinho Amigo, em curso desde dezembro de 2021, momento em que o lube fazia um grande esforço para atender entidades carentes com a entrega de cestas básicas e máscaras cirúrgicas. Por meio dessa iniciativa, que tem a parceria da Nova Charmosa Casa de Pães, localizada no bairro de Perdizes, instituições beneficentes credenciadas pelo clube recebem semanalmente pães doados por clientes da padaria.
Instalados no trajeto dos frequentadores da loja, cartazes e banners contendo os logotipos do clube e da Nova Charmosa divulgam o projeto. Essas peças informam o número de telefone, endereço de email e redes sociais do São Paulo Sumaré, permitindo que os interessados se comuniquem com o clube e acompanhem as entregas das doações. Além disso, um painel eletrônico mantido pelo clube na padaria mostra os resultados atualizados de pães doados na semana e no mês e os números totais desde 2021.
Até julho deste ano, 22.770 pães já haviam sido doados pelos frequentadores da panificadora — que registrou um pequeno aumento nas vendas de pãezinhos desde o início do projeto. No caso da escola, as retiradas semanais, sempre às sextasfeiras, já haviam totalizado 5.250 pães fornecidos até 30 de junho. “Foram impactadas 350 crianças”, Saulo diz. São alunos de seis a 11 anos de idade, do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental estes últimos, o públicoalvo específico do projeto distrital Leia o Seu Futuro, que ensejou a adoção afetiva da Brigadeiro Faria Lima.
“Quando entregamos à diretora e à vicediretora da escola o regulamento do projeto Leia o Seu Futuro, e informamos que haveria a possibilidade de o Rotary Club de São Paulo Sumaré fornecer livros para exercícios de leitura, a orientadora pedagógica Luciana Marostica externou que poderia fazer um grande trabalho com os alunos do quinto ano por meio da leitura de um livro de autor indígena”, recorda Plinio. Guiado por essa orientação, o clube iniciou uma etapa de pesquisa que o levou a uma parceria com a Panda Books, editora do livro A mulher que virou urutau, selecionado pelo corpo docente para ser trabalhado com as três turmas de quinto ano.
A obra narra a lenda guarani sobre a ave: uma bela índia se apaixona por Jaxi, o Lua, que coloca em prova o amor da jovem para saber se o sentimento dela é verdadeiro. Escrito em português e em guarani, o livro é de autoria do casal Olívio Jekupé e Maria Kerexu, que vive na aldeia Krukutu, na região de Parelheiros, município de São Paulo. Olívio é presidente da Associação Nhe’e Porá, escritor e poeta e trabalha pela difusão da cultura indígena.
O São Paulo-Sumaré doou à escola 40 exemplares da obra, 20 deles resultantes da parceria com a Panda Books, divulgada entre outros clubes do Rotary, parentes e amigos: para cada livro comprado no site da editora, o clube receberia outro exemplar do mesmo título de forma gratuita se a palavra ROTARY fosse usada no fechamento do pedido.
VISITA ESPECIAL
Recebidos os livros, as professoras iniciaram com os alunos os exercícios de leitura e interpretação. O trabalho envolveu criação de ilustrações, dança indígena e teatro de sombras, entre várias outras atividades. No mês de abril, o São Paulo-Sumaré procurou Olívio e Maria para propor uma sessão de autógrafos na escola. A visita ficou agendada para 30 de maio, mas Olívio estaria em viagem, por isso foi epresentado pelo filho Werá Jeguaka Mirim, que acompanhou a mãe. Werá é rapper e autor do livro Kunumi Guarani. Em 2020, representou o Brasil na comemoração dos 50 anos do Dia Internacional dos Direitos Humanos.
A programação para receber os escritores foi caprichada. As crianças expuseram os trabalhos criados a partir da leitura do livro e apresentaram uma dança coreografada pelo professor de educação física. Os visitantes cantaram canções indígenas e concederam uma entrevista aos estudantes. Maria e Werá também autografaram todos os exemplares de A mulher que virou urutau. Como forma de retribuir, o São Paulo-Sumaré doou colchões, agasalhos e alimentos para a aldeia Krukutu por meio de uma parceria com a instituição beneficente A Arca de Noé.
Quem também visitou a escola, em outra oportunidade, foi o governador Joaquim Flávio. Ele assistiu a uma apresentação de slides com todo o trabalho dos alunos e professores, entregou um leitor de livros digitais Kindle à instituição de ensino e certificados aos professores e alunos que participaram do Leia o Seu Futuro.
Essa não é a primeira incursão do São Paulo-Sumaré num projeto com enfoque educacional. Há mais de 40 anos, ele é um dos Rotary Clubs que administram o projeto CAMP Oeste – Centro de Assistência e Motivação de Pessoas, onde mil adolescentes de 15 a 18 anos de idade se formam anualmente com condições de ingressar no mercado de trabalho — empresas parceiras locais admitem como estagiários ou aprendizes os alunos diplomados. Situado no bairro da Lapa, o CAMP Oeste atualmente oferece também um curso de cuidador de pessoas que certifica 270 adultos por ano.
Embora o Leia o Seu Futuro tenha sido proposto somente para o período 2022-23, o Rotary Club de São Paulo-Sumaré decidiu manter em 2023-24 a adoção afetiva da Escola Estadual Brigadeiro Faria Lima. “Ainda há muito o que fazer para ajudar nossa escola adotiva”, afirma o presidente Plinio. Para quem gosta de histórias felizes — e quem não gosta? —, a boa notícia é que esta ainda terá mais capítulos antes de chegar ao ponto final.